Quando eu comecei esse blog em 2013, eu não sabia que eu ia terminar o ano cursando uma faculdade de cinema. Eu não sabia que eu tinha um filme favorito, e eu não sabia que eu gostava de escrever sobre filmes. Eu nem sabia escrever direito (e eu ainda não sei).
Eu terminei a faculdade de cinema esse ano, e a minha vida tá bem mais confusa e incerta do que estava quando eu deixei esse blog, no final de 2013. Não vou dizer que tá objetivamente ruim (2017 foi um ano confuso pra todo o mundo aparentemente), mas certamente tá bem diferente. Eu tenho um filme favorito. Eu gosto de escrever sobre os filmes que eu vejo. (Eu não tenho mais um trabalho, mas eu tô tentando me focar nas coisas boas).
2017 foi um ano muito bom pros filmes que eu vi, inclusive. Acho que é o ano com os melhores filmes desde 2012 — quando eu comecei a catalogar as coisas que eu via —, e a maioria dos grandes filmes estrangeiros ainda nem chegaram por aqui — Lady Bird, Me Chame Pelo Seu Nome, Visages Villages, 120 Batimentos por Segundo, A Arte da Discórdia, pra citar só o que tá na conversa por aí. Eu vi ótimos filmes nos cinemas, no Netflix (que eu queria ter visto no cinema), no MUBI (que fez umas programações especiais belíssimas), e minha coleção de blu-rays e DVDs cresceu bonito esse ano. Foi particularmente difícil definir só cinco filmes que eu gostei, então eu queria deixar aqui Jackie, Blade Runner 2049, Z – A Cidade Perdida, O Estranho que Nós Amamos, Paterson e Personal Shopper como os outros filmes que eu amei esse ano, e que você deveria dar uma chance também.
Se você já leu um dos meus posts de retrospectiva dos anos anteriores (2016, 2015 e 2013), vai se familiarizar. O formato é quase o mesmo: eu escolho as cinco melhores estreias1 (filmes lançados comercialmente no Brasil em 2017), as cinco melhores descobertas (filmes que eu vi pela primeira vez em 2017, mas foram lançados em outros anos), as cinco melhores revisões (novidade, tirei as “surpresas”, e agora coloco os melhores filmes que revi esse ano) e os cinco piores filmes (sem restrição). Vamos começar!
Melhores estreias
1. Docinho da América
American Honey. Andrea Arnold, 2016.
Meu filme favorito desde o início do ano, Docinho da América (da mesma diretora de Fish Tank, que eu também adoro) foi como um gancho que me pegou pelo estômago e só me largou três horas depois. Seguindo Star pelo interior profundo dos Estados Unidos, Andrea Arnold observa o que existe daquele paraíso que as pessoas acreditam ser a “América”, um lugar que tanto ela quanto Star descobrem que não existe e nunca existiu, mas que pode-se ver os vestígios em cada rosto daqueles jovens, em cada uma das casas de subúrbio, e nos horizontes infinitos que a Arnold se apaixona tanto quanto Wim Wenders em Paris, Texas. É um filme gigante e poderoso, e eu não duvido que eu nunca mais vou revê-lo, mas que vai viver pra sempre dentro da minha pele.
2. Certas Mulheres (Certain Women, 2016). Eu descobri esse ano que Kelly Reichardt é uma das minhas diretoras favoritas, e Certas Mulheres é o melhor filme dentro de uma fantástica carreira. Íntimo, quieto e empático, esse é um dos filmes que eu me vejo revendo de tempos em tempos, e só amando mais (como se isso fosse possível).
3. De Canção em Canção (Song to Song, 2017). Eu não sou o maior fã da nova safra do Malick (Amor Pleno, Cavaleiro de Copas e Viagem do Tempo), mas De Canção em Canção é um estranho filme que me impressionou por ser íntimo e desesperador — e que me deixou empolgado pra ver o que o diretor vai fazer mais.
4. Mulheres do Século 20 (20th Century Women, 2016). Eu não sou o maior fã de Toda Forma de Amor, mas esse novo filme do Mike Mills é cheio de carinho e de graça pelas suas personagens, e eu amo cada segundo dele com todo o meu coração. É o filme que eu mais gostei de ver o ano inteiro, e o primeiro que eu senti algo tão bom e reconfortante desde a primeira vez que eu vi Ela, há anos.
5. Toni Erdmann (2016). Que sessão maravilhosa a que eu fui assistir esse filme maravilhoso. Toni Erdmann já é uma obra-prima, e ver quanta emoção os meus colegas de sala compartilharam comigo foi mágico. Revendo ele em casa isso só se confirma: o filme da Maren Ade é cheio de energia, vigor e coragem, e foi o mais audacioso filme que eu vi nos cinemas esse ano.
Melhores descobertas
1. Jonas e Lila, até amanhã
Jonas et Lila, à demain. Alain Tanner, 1999.
2017 foi difícil, e revelou pra mim mesmo o meu pior lado — furioso, (ainda mais) cínico e cheio de desprezo. Jonas e Lila, até amanhã me deu esperanças de que, bem, não que o mundo é melhor do que o que o que eu tive na minha cabeça esse ano, mas que ao menos temos esperanças quando enfrentamos ele juntos. Jonas e Lila… pode até parecer desesperador em determinados momentos, mas tem aquela força que eu reconheço de filmes como O Profeta, de capturar um exato momento e lugar, com todos os seus defeitos e pequenos infernos, e torná-lo tão específico a ponto de ser universal e de revelar a humanidade que está por trás dele, e que nos ajuda a encarar o abismo existencial juntos. Vi no MUBI e tive a sorte de rever na Mostra. É um dos meus novos filmes favoritos que esse ano trouxe.
2. A Liberdade é Azul (Trois couleurs: Bleu, 1993). Meu primeiro filme da Trilogia das Cores (que eu tô atrasadíssimo), e eu não sei o que eu tava esperando pra ver esse filme belíssimo. É o tipo de cinema que eu amo: quieto, que ressoa como um suspiro dentro do teu corpo. Inesquecível. DVD.
3. Onde Fica a Casa do Meu Amigo? (Khane-ye doust kodjast?, 1987). Vi por causa do TCC, mas tô tão feliz de ter visto — e que me incentivou a ver muito, mas muito mais Kiarostami (o gênio por trás de Cópia Fiel e Um alguém apaixonado). É simples e simpático, elementar até. DVD.
4. A Longa Caminhada (Walkabout, 1971). Vi um filme do Roeg no meu aniversário (O Homem que Caiu na Terra) e ele ficou como uma marca de queimado no meu cérebro, porque dói lembrar mas ao mesmo tempo eu não consigo não querer lembrar disso (e é legal ficar furungando). A Longa Caminhada eu vi depois de tanto ser citado em The Leftovers, e é como o filme com o Bowie: único — e no bom sentido. Me fez querer ver mais Roeg, e é uma linda parábola do colonialismo que a Austrália é tão interessada em ilustrar em seus filmes. (DVD).
5. Retrato (Portret, 2002). Esse curta do Sergei Loznitsa é magnífico (como todos os outros curtas que vi dele, que tive o prazer de assistir por causa de uma retrospectiva do MUBI), e usa das imagens com movimentos duros e trucagens para penetrar na mente e não sair mais. É como ser testemunha de um mundo alternativo, que pede teu silêncio e que não quer ser encontrado. É, literalmente, um cinema que funciona como janela.
Melhores revisões
1. Cópia Fiel
Copie Conforme, Abbas Kiarostami, 2010.
Uma obra-prima.
Tive que escrever 50 páginas sobre esse filme e, mesmo assim, eu só raspei a superfície. Eu acho que eu vou rever Cópia Fiel enquanto eu viver, e nunca vou conseguir entender tudo o que ele faz em mim. É um mistério, afinal de contas.
2. Sans soleil (1983). O filme/relato/ensaio do Chris Marker é a outra obra-prima que eu assisti esse ano, e que eu quero rever de novo e de novo.
3. Zodíaco (Zodiac, 2007). Eu falo sobre esse filme todos os anos. Eu nunca me canso. Eu amo esse filme demais.
4. Citizenfour (2014). O documentário da Laura Poitras é um dos mais importantes filmes que eu já vi. É como se a história fosse escrita na frente da câmera.
5. O Grande Hotel Budapeste (The Grand Budapest Hotel, 2013). O filme-missão do Wes Anderson, e o seu melhor filme até hoje. Eu adoro esse filme, é como comer um pote de brigadeiro que não acaba e não queima a boca.
Piores filmes
1. Deuses do Egito (Gods of Egypt, 2016). Chato e sem criatividade. Uma pena que não é nem difertido de tirar sarro, é só entediante.
2. Internet – O Filme (2017). Eu felizmente não consegui assistir esse filme inteiro então obrigado a todos os envolvidos.
3. Reality do Medo (The Task, 2011). Uma das coisas bacanas de 2017 foi ver filme de terror ruim nas madrugadas. Esse foi com certeza o pior.
4. Demônio de Neon (The Neon Demon, 2016). Não vou dizer que não é interessante e lindo de assistir, mas eu tô meio cansado dessa estética tão plástica, mas tão plástica, que me dá vontade de colocar a mão na tela e entortar alguma coisa um pouco.
5. Piranha 3DD (2012). Eu nem sei como isso é uma sequência. Nem como isso consegue ser pior.
- Eu não coloquei filmes que foram exibidos na Mostra esse ano mas ainda não foram lançados (24 Frames e Visages Villages ficam pra 2018). ↩